Cerivan Sousa, conhecido também como Tapioca Tapajós, é o atleta paraense, filho de Itaituba, que estará lutando no próximo sábado, dia 27/04 em Magdeburg na Alemanha. Ele disputará o título até 66 kg com um adversário da Georgia, em um evento organizado pela The Cage MMA.
Ele foi convocado com apenas uma semana de antecedência, em função de uma substituição de última hora, mas está “muito bem-preparado” como afirmou em suas redes sociais.
No dia 23/04, ainda em solo brasileiro, Cerivan concedeu uma entrevista exclusiva ao Vox Tapajós. Contou um pouco mais sobre esse desafio internacional, sua estratégia para o combate, relembrou a sua trajetória e opinou sobre a ausência de apoio, inclusive do poder público.
Confira a seguir a entrevista e conheça um pouco mais sobre esse guerreiro!
VoxTapajós: Cerivan, em breve você embarcará em uma viagem para o lugar mais distante de onde você nasceu. Como você se sente, ao relembrar sua própria trajetória, considerando onde você estava e onde está agora?
Cerivan: É uma satisfação, pois vendo que tudo que eu plantei hoje eu estou colhendo, entendeu? Pois eu acho que é importante tu amar o que tu faz. Quando tu ama o que tu faz, batalha duro, tu consegue, entendeu? Uma coisa que eu sempre falo, a caminhada é longa, mas a chegada é certa. Nada é fácil na vida, entendeu? Pois quando tem fé mano, acredita em Deus e acredita no teu potencial, tu consegue irmão.
VoxTapajós: O que você aprendeu nas últimas lutas e que carrega como experiência? Quais as lições das tuas últimas lutas, as falhas que pretende corrigir e os acertos que pretende aplicar?
Cerivan: Saber lidar em qualquer adversidade. Ter um psicológico pronto, pois tudo o que a mente pode imaginar, essa mesma mente pode realizar, entendeu? Foi o que eu aprendi nas minhas últimas luta, sabe… nas minhas últimas lutas eu só peguei “pedreira”, peguei cara muito duro pra lutar.
Mas a partir do momento que eu acreditei que eu era capaz, eu realmente fui capaz. Pois se eu não acreditar, e colocar na minha cabeça que eu posso, que eu consigo, eu não vou ser… pois o pior inimigo que eu enfrentei todos esses anos foi eu mesmo, sabe? E hoje eu tenho a plena convicção disso, que eu sou capaz de realizar todos os meus sonhos e chegar aonde eu quero.
VoxTapajós: Com pouco tempo de ciência sobre a luta, você já teve tempo de estudar seu adversário, as habilidades e estilos que ele tem? Qual a sua estratégia para esse combate em específico?
Cerivan: A minha estratégia é usar técnica, sabe? Eu preservo muito a qualidade técnica. Mas luta é luta. A luta sempre pode surpreender a gente.
Ele (o adversário) é um cara que ele nunca lutou mais de 2 rounds. A luta dele é sempre com 1 minuto, 2 minutos de luta. Ele está vindo de 6 nocautes consecutivos, ganhou as 6 luta por nocaute.
A minha estratégia é minar a panturrilha, entendeu? minar panturrilha, bater, sair e minar a linha de cintura pra acabar com o gás dele, sabe? Pois ele não é costumado a ter luta prolongada e eu sou, já tenho essa experiência. Ele é um cara que tem muita força, ele é um cara muito forte, mas ele não é um cara tão técnico, sabe? Ele é um cara que chuta muito, tem a mão muito dura, ele bate pesado, mas quando a gente procura muito o nocaute, a gente acaba sendo nocauteado. Quando a gente procura muita finalização, a gente acaba sendo finalizado.
A gente tem que ter a estratégia na mente, saber o que vai fazer, ter plena convicção. Se ele me der um pavoro… assim aquela blitz… eu tô com o meu psicológico pronto pra isso, pra saber o quê que eu vou fazer, sabe? Mas na primeira oportunidade vou finalizar, que é meu carro forte. Se ele moscar muito, eu vou nocautear ele, que eu tenho mão pra isso? Eu tenho a mão pesada, entendeu? Sou um cara que aguenta porrada… e é essa a estratégia.
VoxTapajós: Em termos de habilidades nas Artes Marciais Mistas (MMA), quais as tuas principais características? Em quais artes você tem mais domínio?
Cerivan: Minha principal habilidade como é de se esperar, né…é o jiu-jitsu. Eu sou oriundo da capoeira, comecei a minha capoeira com o Santinho, que trabalha na relojoaria no porta-balsa (Em Itaituba) e depois de tanto eu apanhar, eu comecei a treinar jiu-jitsu.
Foi quando o mestre Alex entrou na minha vida, uma pessoa maravilhosa, uma pessoa que é praticamente meu segundo pai, que me devolveu a vontade de viver! Fez eu voltar a estudar! No decorrer dos anos eu fui entender que não (é questão de) apenas ser um bom lutador, mas sim saber me portar durante uma entrevista, saber conversar com um fã, saber me portar perante as câmeras, foi de extrema importância na minha vida, entendeu? Mas meu carro forte é o jiu-jitsu.
Não treinava luta em pé porque eu não gostava, mas toda vez que eu ia lutar eu falava: “pô, se eu não colocar o cara pra baixo tá ruim pra mim” e eu desbloqueei isso da minha mente e coloquei que eu era bom de trocação, entendeu?
Hoje não sou um cara expert na trocação, mas eu sou um cara que eu troco porrada de igual pra igual com todo o mundo. Se eu não conseguir colocar o cara pra baixo, eu não me frustro, entendeu? Pois eu tenho plena convicção que eu tenho potencial para nocautear, eu tenho técnica, eu tenho um força, eu tenho habilidade, eu tenho um preparo pra isso.
VoxTapajós: Tem alguém te patrocinando no momento?
Cerivan: No momento não tenho patrocínio. Eu tive patrocínio uma vez, quando foi quando eu fui para Belém, quem me patrocinou foi JJP construtora. Isso foi em 2018, sabe? Foi quando me ajudaram, me deram uma força. De lá para cá, foi só eu e Deus, sabe… quem me ajuda quando pode é a minha mãe sabe, ela é aposentada e sempre que ela pode ela me ajuda. um amigo meu, o Daniel Maia, que sempre que eu tô precisando, assim muito aperreado, eu falo, “Daniel, o negócio tá feio…” ele vai e me ajuda, e outros amigos também…Mas patrocínio mesmo não tem. Eu vendo balinha no sinal atualmente, eu vendo bombom, doce… pra eu me manter aqui no Rio de Janeiro.
VoxTapajós: Como você foi parar no Rio de Janeiro?
Cerivan: Bom, eu já lutei aqui no Rio de Janeiro, na mesma equipe que hoje eu faço parte, a RD Champions, lutei em 2020, se eu não me engano, ou 2021…eu acho que foi em 2020 que eu lutei. Foi o tempo que eu comecei a fazer meu nome, né, comecei a ficar conhecido…e decidi vir para o Rio de Janeiro, aproveitei o embalo, entendeu?
Quando eu falei “irmão, eu estou querendo ir para a equipe” eles me acolheram de braços abertos, entendeu? Fui muito bem acolhido, pois eu já tenho uma história, eu tenho um nome a ser zelado, entendeu? Todo mundo me conhece, todo mundo sabe a minha trajetória, então sou um cara muito respeitado na arte marcial e hoje eu estou aqui na equipe.
VoxTapajós: Você sempre enfatizou que na sua história o esporte foi essencial, te tirando de um caminho que estava longe do ideal. Qual o conselho que você daria para os jovens que hoje estão em uma situação que você já esteve um dia?
Cerivan: O conselho, que eu dou, é: Escute os mais velhos. Como é que tu vai acompanhar uma pessoa que não conseguiu nada na vida, sabe? Não falo de tu ter um carrão ou uma casa, ou morar fora do país, não… o que eu falo é construir uma família, ser um bom pai de família, ser um bom filho, ser uma boa filha, entendeu? Como é que eu quero dar exemplo para o meu filho, se eu mesmo não tenho caráter, entendeu?
Pô, todo mundo sabe da minha história, pô, a minha vida era fazer bagunça, só vivia preso por confusão, por briga, entendeu? Então, quando eu comecei a andar ali com o mestre Alex, com o Arthur, com o Alan, com o Jussyê, pô, eu comecei ter uma visão diferente…eu falei “os caras tem estudo, os caras são da sociedade”. Eu comecei a enxergar a vida de outra forma, sabe? Foi quando o mestre Alex me influenciou a voltar a estudar, e isso abriu um leque de possibilidades na minha vida. Eu comecei a enxergar os problemas, como a possibilidade de eu crescer na vida, sabe…
VoxTapajós: Como você enxerga a questão do apoio público ao esporte, em especial às artes marciais?
Cerivan: É decepcionante, pois eu vejo muitas pessoas aí em Itaituba, tipo Bruno, o James, o Michel, entendeu, mestre Adalto, mesmo no auge, o Rafael. São pessoas que tinham tudo para ter uma carreira brilhante, mas não tiveram apoio, entendeu? Hoje quem está no Rio de Janeiro? Eu, Harlisson, Elias e Rangel. Elias, Rangel e Harlisson representam o município de Novo Progresso, porque em Itaituba eles não tiveram apoio, entendeu? são filhos de Itaituba, mas representam Novo Progresso. E eu não represento nem um nem outro, represento o Pará, sabe…
Porque quando surgiu aquela minha trajetória que eu fui embora, eu fui caminhando, foi por falta de apoio… eu pedia uma ajuda, “hoje não tem”, “Ah, vem, depois”, “Ah, hoje eu não tenho”, “Ah, hoje tá fraco, vem depois”, pô, isso cansa, tudo demais, cansa, sabe… E isso vai frustrando a gente… eu sabia do potencial que eu tinha, eu sabia que eu conseguiria, mas se eu ficasse ali, eu não ia crescer, entendeu?
Então, hoje em Itaituba, o pessoal só tem visão para o futebol… não tem visão para as artes marciais, como o kickboxing, o karaté, a capoeira mesmo, que foi onde eu comecei, que é uma arte maravilhosa… e o jiu-jitsu. A gente depende muito de um amigo ou outro que ajuda. Eu, particularmente, sou lutador profissional de MMA, tenho 11 lutas profissionais de MMA, tenho 8 vitórias, entendeu? Sou vice-campeão paraense, eu tenho apoio de quem em Itaituba?
O setor público não apoia, entendeu? E hoje o pessoal fala “Ah, ele é de Itaituba e tal” o pessoal acha que eles estão patrocinando a gente, mano, não tão… eles não tão. Eles só se lembram de ti, em época de política. Fora isso, eles não lembram de ti, então é muito decepcionante. E enquanto isso não mudar, cara, é daí pra pior.
VoxTapajós: Em ano eleitoral, muitas pessoas aparecem com promessas de apoio ao esporte, e até acabam se elegendo com essa bandeira, mas o que se vê na prática é que tais promessas não se concretizam no mundo real. O que você pensa sobre isso?
Cerivan: Se não me engano, em Oséias (na bíblia) que está escrito, se não me falha a memória “o meu povo perece por falta de conhecimento”, e muita das vezes a gente ouve a verdade, a gente vê a verdade, mas prefere acreditar na mentira, pois acreditar na mentira é mais fácil, entendeu?
É sempre a mesma conversa… e muitas vezes o povo não pode reclamar porque eles mesmos que elegem. Como eu vou trocar o meu futuro, o futuro do meu filho por um milheiro de telha, por um milheiro de tijolo, por uma lata de tinta, entendeu? Em época de eleição (os políticos) chegam te oferecendo as coisas aí tu vai lá e chama tua família pra votar no cara porque ele te deu um milheiro de tijolo… Ai você se **** o ano todinho… 4 anos… para eles vir atrás de ti, entendeu? Então o povo parece por falta de conhecimento. Mano, a gente sabe o que está acontecendo, mas a gente não quer acreditar.
VoxTapajós: Cerivan, em um momento importante como esse, é natural que muita gente fique empolgada, e queiram participar dessa “glória”, mas nem todos conhecem ou participam da tua jornada. Como você lida com isso?
Cerivan: Lutar é a parte mais fácil que tem. O difícil é o processo, o difícil são os bastidores, entendeu?
É tu apanhar todo dia na academia, sabe… tu não ter dinheiro pra tomar um sorvete, não ter dinheiro pra tomar um suco… tu escutar que tu não vai conseguir, que isso aí não é pra ti… não ter apoio de ninguém, o cara tem que ter psicológico para isso, porque se vir, pô, bacana. Mas se não vir, filho, eu tenho que ter um psicológico blindado, porque tudo vai da mente do cara, entendeu? Se não tiver psicológico pronto pra batalha, tu não consegue não…
Todo mundo quer ser um campeão, mas quando chegar na hora de fazer o que um campeão tem que fazer, é a hora que muitos desistem.
VoxTapajós: Qual o exemplo que você espera ser, e qual o legado que você pretende deixar para as pessoas enquanto atleta? Qual o impacto que você espera causar na mentalidade das pessoas, considerando a visibilidade que a tua participação nesse evento internacional está te trazendo?
Cerivan: Eu não quero ser legado, eu só quero que as pessoas acreditem nelas mesmo, que elas são capazes, entendeu? As pessoas desistem dos seus sonhos porque elas escutam conselho de quem não construiu nada na vida…
Se eu sou bagunceiro, e me juntar com outra pessoa bagunceira, eu vou ser mais bagunceiro ainda. Se eu sou cachaceiro e eu me junto com outro cachaceiro, eu vou ser mais cachaceiro ainda, não tem exemplo não, eu era desse jeito.
Mas a partir que eu me apoio sobre ombro de gigante, a possibilidade de eu vencer na vida é grande, tendo aquelas pessoas como exemplo, tendo outra visão sobre o mundo… eu só quero que as pessoas acreditem nelas mesmo.
As pessoas pensam muito naquilo que os outros falam, elas não acreditam no potencial delas. E pode reparar que as pessoas que ficam reclamando não conseguiram nada… e como vai te influenciar pra te conseguir alguma coisa se ela não conseguiu nada, pô, entendeu?
Não estou falando de bem material, é no sonho dela, pô. Todo mundo tem um sonho, pô, mas se tu não batalha por ele… cada sonho que tu deixa para trás é um pedaço do teu futuro que vai deixar de existir na tua vida, entendeu? Então é melhor errar tentando do que se arrepender de nunca ter tentado, entendeu?
Então tudo é possível, cara, tudo é possível. Mas tem que ter força de vontade, tem que querer. Se tu não quer, cara, eu posso ser a melhor pessoa do mundo, que eu não vou conseguir entrar na tua cabeça, entendeu? Tudo vai depender de ti, não é de mim, nem de fulano e nem de beltrano.
Na torcida
Cerivan estará divulgando em seu instagram o link para acompanhar a sua luta, segue abaixo o perfil dele: @cerivan_tapioca_tapajos